sexta-feira, 25 de março de 2011

Bailarinos

Alguns bailarinos me fazem vibrar antes da hora. Estou curiosa (e ansiosa) para ver meus queridos bailarinos da São Paulo Companhia de Dança. A temporada começa amanhã e não consegui ver ensaios ou fazer entrevistas. Mas não poderia deixar de dizer que estou torcendo imensamente, que meu coração está sempre perto. Eles são incríveis.

Minha "mexicana" favorita Renata Bardazzi em Inquieto. Foto: Silvia Machado
Para quem ainda não sabe, a estreia da nova temporada acontece amanhã, no Sesc Pinheiros, com Theme and Variations (1947), de George Balanchine, Legend (1972), de John Cranko, com remontagem de Richard Cragun, e Inquieto (2011), coreografia inédita de Henrique Rodovalho.

Casal incrível, Ed Louzardo e Paula Penachio, em Legend. Foto: Silvia Machado
Mais comentários depois da estreia. Na próxima semana também vou participar dos programas educativos e de formação de plateia paralelos.

Mais informações: saopaulocompanhiadedanca.art.br

São Paulo Companhia de Dança no SESC Pinheiros

Dias 26 e 27 | Sábado, às 21h, e domingo, às 18h
Dias 31 de março e 1, 2 e 3 de abril | Quinta a sábado, às 21h, e domingo, às 18h
Rua Paes Leme, 195 – Pinheiros
Os ingressos custam R$ 15; R$ 7,50 (usuários matriculados, idosos com mais de 60 anos, estudantes com carteirinha, professores da rede pública, usuários MIS); R$ 5 (trabalhador do comércio e serviços matriculado).

Angel Vianna

Eu a conheci pessoalmente ano passado, por conta do documentário Figuras da Dança, projeto da São Paulo Companhia de Dança, em sua homenagem. Já a tinha visto no palco, mas essa aproximação me deu outra dimensão. Minha admiração profissional também se tornou admiração pessoal.

Angel Vianna é agitada e curiosa; mais importante, tem generosidade com quem está ao seu lado. Até hoje se interessa em saber mais pelo corpo, sua ferramenta de vida e de trabalho. Conseguiu, contrariando todas as burocracias, abrir uma Escola e Faculdade de Dança no Brasil, no Rio de Janeiro, que leva seu nome. Em grande medida, a dança contemporânea da cidade deve muito à sua atuação, não são poucos os nomes que passaram por suas aulas.

Outra parte de seus alunos atua em áreas da saúde, como hospitais e clínicas de recuperação motora. Há outros que só querem ter o prazer de fazer uma aula da Angel e eles têm o privilégio de conhecer um pouco mais sobre movimentos, sentimentos e respeito aos desafios pessoais. O teatro brasileiro também é devedor de sua inteligência e disposição para encontrar meios de expressão do corpo. Na década de 1970, fez da preparação corporal um caminho de comunicação e influenciou toda uma geração.

Aos 82 anos, 62 de carreira, Angel Vianna volta à cena e divide o palco com Maria Alice Poppe, sua ex-aluna, em coreografia de João Saldanha. O espetáculo Qualquer coisa a gente muda será apresentado em São Paulo, em curta temporada no Sesc Belenzinho. Nesse diálogo entre gerações da dança, elas encontram um modo de unir sensibilidade e memória, cada uma a seu modo.

Angel Vianna tem papel fundamental na história da dança no Brasil e vale a pena ver de perto o que tem a dizer.

Informações:

A capacidade do Teatro do SESC Belenzinho é de 392 lugares. Porém, este espetáculo se inicia com um prólogo de 8 minutos, limitado a 150 pessoas. O acesso ao teatro acontecerá 20 minutos antes para as 150 primeiras pessoas, por ordem de chegada. Depois de terminado esse pequeno prólogo, o público geral poderá acessar o teatro para o início do espetáculo. Local: Teatro Duração: 45minutos

R$ 24,00; R$ 12,00 (usuário matriculado, a partir de 60 anos e estudantes). R$ 6,00 (trabalhador no comércio e serviços matriculado e dependentes, a partir de 60 anos e estudantes). Dia(s) 25/03, 26/03, 27/03 Sexta e sábado, às 21h e domingo às 18h.

segunda-feira, 14 de março de 2011

A vida em companhia

Ainda não vi Cisne Negro, de Darren Aronofsky, com Natalie Portman. Mesmo assim, pelo que li, o filme me fez pensar em alguns pontos da vida de bailarino. Um deles, os testes quase diários a que são submetidos, as audições, a escolha de elenco, o desejo de dançar sempre. Como se escolhe um ou outro para um determinado papel?

Durante os dois anos que trabalhei na São Paulo Companhia de Dança, acompanhei mais de perto o dia a dia dos bailarinos e, entre aulas e ensaios, me envolvi pessoalmente com suas histórias, suas emoções, suas alegrias. Nesse tempo, passei por duas audições. Era uma expectativa receber currículos, vídeos e fotos de estudantes ou profissionais tentando uma vaga. Esta apresentação virtual selecionava os que poderiam vir para a segunda fase. A competição é dura e tem um pouco de sorte do momento: dependendo do ano, precisa-se de um tipo específico de bailarino, mais alto, mais baixo, mais homens ou mais mulheres.

Da lista de centenas, apenas 60, em média, chegavam para as provas na Companhia, 30 homens e 30 mulheres. Algumas etapas, aula de balé clássico, aula de moderno, sequências do repertório. A cada uma, novos cortes. No fim, apenas cerca de 10 são selecionados. Era uma alegria ver os que ficavam. A sensação de conquista é gratificante.


Nielson Souza. Foto: Silvia Machado
Contudo, é apenas o primeiro passo. A grande prova está por vir. Quando chegam às aulas e aos ensaios iniciais, a provação é bem maior. Eles começam a ser comparados aos outros profissionais que estão há mais tempo no grupo. Ganhar um papel especial, ser primeiro elenco, ter chances de mostrar seu talento são questões que fazem parte da profissão. Estão sozinhos e geralmente começam a carreira aos 18, 19 anos. Claro que nem sempre há o peso da personagem de Natalie Portman, mas é preciso uma inteligência diferente, que transita entre a perfeição técnica e o entendimento de cada um para carga de informações de professores, ensaiadores e coreógrafos.

Como se destacar em um meio no qual todos querem mostrar o melhor? Márcia Haydée, a grande bailarina brasileira, conta que, quando teve sua primeira chance profissional, no Balé do Marquês de Cuevas, ainda no corpo de baile, aprendeu todos os papéis, do conjunto aos solos. Foi assim que uma noite em Paris, quando as quatro solistas ficaram doentes, ela teve a chance de dançar um papel solo. Recebeu uma promoção em seguida. Não parou mais.

Gostaria e tive a permissão de falar de dois casos, que vi pessoalmente e são cada vez mais lindos no palco: Juliano Toscano, de Santa Catarina, e Nielson Souza, da Bahia. Os dois entraram na São Paulo na temporada de 2010. O que me chamou atenção desde o princípio foi: os convidados que entravam na sala de ensaio – e não são poucos – sempre perguntavam: quem são? Como eram aspirantes, não tinham grandes destaques, mas começaram a trabalhar rápido.

Nielson me disse sobre o primeiro dia de aula: "O primeiro dia de aula foi assustador, até porque tudo que é novo assusta de alguma forma. Sempre tive contato com muitos bailarinos de todos os gêneros, raças e desenvolvimento técnico. Mas,quando entrei na SPCD, fiquei intimidado pelo nível altíssimo do elenco e a forma como a dança estava presente na vida de cada um. Foi desafiador. Cada dia, cada aula, cada ensaio. Acredito que, como tantos outros, foi mais um degrau que tive que subir."

Juliano tem perfil mais clássico, Nielson, veia mais contemporânea. Mas os dois transitam entre as linguagens propostas pela Companhia. Cada um ao seu modo, o que vi foi uma incansável dedicação de ambos, sem muito alarde, sem falar demais. Eles aprenderam tudo o que podiam e, em menos de dois meses, estrearam em papéis de coreografias do repertório. E foram crescendo, se destacando. “Quando entrei, pensei, tenho que aprender tudo o que me pedirem. Isso me ajudou porque, a qualquer momento, poderia ser escalado para dançar e tive a oportunidade de mostrar meu trabalho muito rápido. Foi muito bom para mim dentro da Companhia”, me contou Juliano.

Juliano Toscano. Foto: Silvia Machado
Driblaram suas dificuldades, aquele mal-estar de iniciar uma carreira (mesmo quem não é bailarino já deve ter sentido isso) e, agora, em 2011 estão no primeiro elenco em diferentes coreografias da Primeira Temporada da Companhia, que acontece no fim do mês (falo disso muito em breve): Juliano em Theme and Variations, também ensaia Tchaikosky Pas de Deux (que eu ainda não vi com ele), ambas de George Balanchine. Nielson dança Theme and Variations e Inquieto (estreia), de Rodovalho.

Pergunto sobre como conseguir se destacar em uma situação como a deles. “Acho difícil falar em destaque, ainda mais quando olho para o lado e vejo os bailarinos que tenho à minha volta. Sempre fui muito tímido e observador. Consigo absorver e extrair tudo que possa ser proveitoso para minha vida, e com a dança não é diferente. Quando cheguei, me perguntava se estava no lugar certo, se tinha condições de estar ali. Sempre fui muito autocrítico. Os primeiros meses serviram para me firmar como parte de tudo aquilo, ou melhor, me sentir parte de tudo aquilo. Depois foi bem mais fácil, só precisava fazer umas das coisas que mais amo na minha vida. E, pode soar meio piegas, mas tudo que a gente faz com amor, é incrivelmente bom!”, fala Nielson.

O que quero dizer é, longe dos cenários, figurinos e maquiagem, a sedução da dança é no esforço sem holofotes do cotidiano, com energia e disposição. Nem sempre o mais talentoso segue em frente, sem se dedicar, sem se envolver diariamente com a dança. Não é tarefa para amadores, mesmo eles sendo, na grande maioria, tão novos. Por isso, minha admiração pelos dois bailarinos citados aqui.

Só no blablablá

Para nossa sorte, Samuel Kavalerski resolveu dançar mais um pouco. Ele é ótimo bailarino (sabe a medida entre seu deslocamento, sua intensidade e, claro, sua técnica), também é lindo. Está no elenco de Inquieto, coreografia de Henrique Rodovalho para a São Paulo Companhia de Dança com estreia dia 26 de março, no Sesc Pinheiro, em são Paulo. Muito importante, é meu amigo e foi meu professor!!!!!!!

Samuel Kavalerski e Renata Bardazzi no pas de deux de Gnawa. Foto: João Caldas

quarta-feira, 9 de março de 2011

Dois prá lá, um prá cá

Um passo, a dança. Uma dança, o passo.


Em Pas de danse (http://www.sintomnizado.com.br/pasdedanse.html), projeto do bailarino Samuel Kavalerski, o movimento aparece com o deslizar do mouse, no estreito espaço entre duas figuras, e depende da velocidade e vontade de quem está observando. A sequência e a ligação dos 11 pas nos levam a questionamentos bem-humorados e inteligentes da dança, no projeto que começou há alguns anos, mas que ainda inquieta. Para sempre plié?, nos deparamos em algum momento.

Pas de danse tem a tradução literal como “passo de dança”, mas “pas”, em francês, também é advérbio de negação. Nesse caso, teríamos “não dança” ou “sem dança”. Samuel joga nessa linha delicada entre a dança e sua falta; entre humano e intermediações eletrônicas.

Samuel Kavalerski é bailarino. E inquieto. Passou pela Balé do Teatro Guaíra, pela Quasar Cia de Dança, de Goiânia, e pensou em parar de dançar. A decisão estava tomada, mudou-se para Paris. Ficou sabendo da audição para a São Paulo Companhia de Dança e resolveu dançar mais um pouco.

A seguir, uma pequena entrevista sobre o projeto em que dança e internet se apresentam em um diálogo possível.
Gostaria que contasse um pouco como surgiu o projeto

Já há um tempo eu trabalhava com um programa de animação e criação de web sites chamado Flash. No meu trabalho de conclusão do curso de Artes Visuais eu desenvolvi uma animação interativa, chamada O Corpo do Príncipe (www.sintomnizado.com.br/ocorpodoprincipe.html). Ali, a dança era o tema do meu trabalho. Eu usava a linguagem da internet e a sua principal especificidade, a interação, para falar de dança e de um dos estereótipos do balé clássico.

Depois desse trabalho, eu sempre fiquei imaginando como eu poderia criar algo que fosse tanto um website quanto uma coreografia. Eu não queria só usar a dança como tema de um site, eu queria fundir as linguagens, falar de interação e de dança simultaneamente.

Em 2007, quando eu saí da Quasar, fui morar em Paris com o objetivo claro de não dançar mais. A minha relação com a dança tinha se esgotado de uma maneira bem intensa. Acho que uma parte importante do conceito de "não dança" do trabalho vem desse sentimento. Nesse período que eu passei na França, eu tinha muito tempo livre. Andava pela cidade enquanto pensava muito sobre muitas coisas. Aos poucos foi se consolidando o formato do Pas de Danse: a ideia de uma dança formada por fotografias, como uma animação em stop motion, cujo ritmo e velocidade seria dado pela interação de quem fruísse a obra.

Quando um passo de dança é uma não-dança?

Acho que, na vida real, qualquer passo pode ser uma dança. Basta alguém declará-lo.

No mundo dança, fala-se muito da importância dos passos de ligação. Seria nesse "entre" das formas que moraria a essência da dança, nesse caminho entre uma pose e outra. Eu gosto bastante dessa ideia e dou muita importância a isso. O que acontece com o Pas de Danse é que a sequência de imagens cria a ilusão de dança, mas lhe falta justamente a ligação entre as poses, lhe falta a essência da dança, o movimento. E por ser contra, por ser o oposto e se denominar "não-dança", ele passa a sê-lo.

O que é importante na dança para você?

Ultimamente tenho dado muita importância para a beleza. Acho que o mundo contemporâneo tende a nos levar para dois pontos perigosos: uma tecnicidade quase mecânica e uma conceitualização que parece funcionar como um repelente. São tendências cujos valores são essenciais e reconhecidos, mas acho triste quando elas pretendem tomar conta de tudo e acabam transformando a arte em algo frio e desinteressante. Tenho me sensibilizado com coisas belas, não no sentido matemático de proporções ideais, mas sim no que a beleza tem de sublime, de encantador. São situações raras, na maioria das vezes impalpáveis, mas valem muito a pena.