segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Balé Teatro Castro Alves | Crítica

A Quem Possa Interessar. Crédito: Divulgação
A Quem Possa Interessar é a coreografia de Henrique Rodovalho feita sob encomenda para o Balé Teatro Castro Alves. Um encontro de histórias delineadas em tempos e propósitos distintos. De um lado, o criador da Quasar Cia de Dança, de Goiás, inquieto e urbano, para quem explorar os limites dos movimentos e suas reverberações no corpo se tornou marca registrada. De outro, a companhia baiana com bailarinos em idade entre 35 e 60 anos, formada em 1981, sob o comando de Antonio Carlos Cardoso, cuja característica foi saber dosar a dança formal às manifestações populares. O trabalho traz como grande riqueza o diálogo em que visivelmente os dois lados foram ouvidos. A estreia foi em agosto passado, no teatro da companhia, em Salvador. Em São Paulo, o grupo fez uma série com três coreografias no teatro do Sesc Vila Mariana, de 10 a 13 de fevereiro. As outras duas, À Flor da Pele, de Ismael Ivo, e 1Por1PraUm, de Jorge Vermelho, atual diretor. (Infelizmente, só vi apenas a primeira, motivo da crítica).


Foi uma peça feita em parceria, nos informa o programa. Rodovalho sugeriu que cada um dos 24 bailarinos resgatasse experiências, gostos e trajetórias. Pediu depoimentos e os gravou. A Quem Possa Interessar inicia-se justamente com as palavras dos bailarinos contando desejos e histórias de vida. Passando de uma a outra confidência, eles dançam sozinhos, acompanhando suas vozes. Não recriam exatamente o que dizem, interagem com as situações narradas, de modo bem humorado e leve. Não é a primeira vez que Rodovalho usa o recurso, em Coreografia para Ouvir, de 1999, uma de suas maiores obras, a Quasar foi buscar nas vozes de artistas regionais motivos para dançar. Mas diferentemente desse trabalho, a atual obra intercala depoimentos com canções, gravadas e ao vivo cantadas pelos próprios artistas.

Rodovalho também imprimiu seu estilo, sem exigir, contudo, que os corpos já mais velhos conquistassem o vigor dos seus bailarinos. Mas está tudo lá, os movimentos a um só tempo pouco simétricos e fluentes, o uso do chão, a luz pontuando a cena, os desenhos coreográficos, o humor. Aproveitou a afinação e colocou a interpretação em cena. Respeitosamente, não expôs nenhum integrante ao que não podiam, não há qualquer habilidade que transpareça buscar um tempo sem volta, de energia e de virtuosismo.

Se Rodovalho entendeu a leveza e o caldeirão cultural da companhia bahiana, os bailarinos retribuíram esforçando-se para devolver corporalmente com seu estilo. Há certa secura e precisão, características do coreógrafo, mas também ginga. Os momentos mais memoráveis estão nesse encontro, em particular quando os homens dançam em conjunto ou quando todos, ao cantar e dançar, ocupam distintas porções do palco.

Em um balé como esse não escapa a dimensão humana e, por se alongar um pouco, o sentimentalismo tira parte do impacto. Não perde, no entanto, o valor de restaurar a dança em seu tempo e lugar.

Veja outros lados da mesma coreografia em Tudo é Dança.

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