Como bom artista, Ivaldo Bertazzo viu nos gestos cotidianos, estes que todos fazemos sem nos dar conta – pegar o açúcar, amarrar os sapatos, comer – um modo de dançar. É aparentemente simples, porque evidencia a capacidade humana de movimentar-se. Nessa ação elementar encontra-se a chave de seu longo projeto, mais de 30 anos, como profissional além dos palcos, o educador do movimento. Suas aulas recobram a necessidade de mudarmos constantemente de posição. “O corpo é submetido à gravidade e ele luta, até morrer, contra ela. Ele muda de forma o tempo todo porque a vertical suprema que atingiu é também sinônimo de enrijecimento. Ela só pode existir, essa soberba vertical, quando você está caminhando, é quando ela é plena. A partir daí, tudo é dor, cansaço e rigidez”, diz Ivaldo Bertazzo. Para comprovar, pense quando fica sentada mais de duas horas seguidas, as costas começam a doer, os ombros não encontram uma posição confortável, vai travando, criando tensões. Se o corpo não se mexe, endurece, fixa-se em posições estanques – o que não é natural. “O corpo precisa mudar de forma o dia inteiro: agachar, sentar, deitar, rolar no chão. Quem está fazendo isso diariamente como um mecanismo de sobrevivência?”. Com a falta de movimento, ele perde, pouco a pouco, a vivacidade. E, nós, segundo Ivaldo Bertazzo, somos muito mais do que um corpo. “Ele é um instrumento: de comunicação, de relação, de percepção, de sensação, de barato, de poder em alguns momentos.” E como instrumento tem sua objetividade, comemos, andamos, sentamos. Em um mundo cada vez mais ágil, rápido e digital, a mobilidade parece, cada dia, mais restrita. Passar o dia em frente ao computador ou em reunião hoje é a rotina das pessoas, inclusive a feminina. “O problema é hierárquico, estamos vivendo um esfacelamento das funções de cada um nesse período, então os corpos femininos correm de um lado para o outro para se adaptar. Há uma hiper solicitação”. De modo mais explicativo, as mulheres assumiram funções masculinas (muitos homens também começam a ter seus papéis revistos), o trabalho fora de casa, a provisão. Por outro lado, ainda são mães e organizadoras. “Tem que saber que ela sai desse papel masculino necessário na empresa e vira a mãe. E que é importante e natural chegar em casa e agachar, se adaptar ao filho pequeno – e não o contrário, fazer a criança se adaptar a ela porque não consegue mais dobrar a virilha. Sem “tirania”, Ivaldo Bertazzo ressalta que prestar atenção a pequenos atos pode mudar a vida. “No banho, por exemplo, sinta a água circulando na sua pele, e a sustentação do esqueleto, subindo em uma cama elástica e balançando o corpo”.
Publicada na revista TPM - edição 66, junho de 2007
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